segunda-feira, 10 de junho de 2013

Apple Tree oh Apple Tree, under you what can i see?



"It is remarkable how closely the history of the apple tree is connected with that of man."
 
Henry David Thoreau






 

 


"(...) No terreno, através da névoa rasa, viu com curiosidade infantil uma terra suja e seca, endurecida pela madrugada. O homem não antecipou nada: viu o que viu. Como se olhos não fossem feitos para concluir mas apenas para olhar.
 
Até que, mais um segundo dessa própria isenção, e também sua cabeça foi atingida com graça pela incompreensão do que ele via. E num engano de que certamente precisou, um engano tão certo quanto a queda certa de uma maçã, ele teve um sentimento de encontro: pareceu-lhe que no grande silêncio ele estava sendo saudado por um terreno da era terciária, quando o mundo com suas madrugadas nada tinha a ver com uma pessoa; e quando, o que uma pessoa poderia fazer, era olhar. O que ele fez.
 
É verdade que seus olhos custaram a entender aquela coisa que nada mais do que: acontecia. Que mal acontecia. Apenas acontecia. O homem estava “descortinando”.
 
O terreno fora provavelmente uma tentativa, por fim abandonada, de jardim ou horta. Percebiam-se restos de um trabalho e de uma vontade. Certamente haviam alguma vez tentado estabelecer ali ordem inteligível. Até que a natureza, antes expulsa pelo plano de ordem, voltara sorrateiramente e lá se instalara. Mas em seus próprios termos.
 
Porque, qualquer que tivesse sido a sua época de glória e viço, agora o terreno tinha o silêncio do que é entregue a si mesmo. Havia algumas pedras cinzentas e duras. Um pedaço de tronco deitado. Raízes expostas de uma árvore havia muito tempo cortada, pois nenhuma umidade porejava mais no corte oblíquo. Ervas cresciam verticais. Algumas haviam atingido uma altura que já as tornava sensíveis à brisa adstringente da aurora. Outras eram rasteiras e coladas ao chão, e deste não se arrancariam sem morte. Terra grossa se esfarelava junto de um formigueiro; era uma desordem tranquila.
 
O homem ficou olhando até que a vida que se instalara no terreno começou a acordar. Mosquitos brilhantes, como se transportassem para ali o primeiro carregamento de luz. O passarinho cauteloso entre folhas secas. De uma pedra para outra, se cruzaram ratos e ratas. Mas na irmanação do silêncio, como um fuso trabalhando, um movimento não se distinguia do outro. Essa foi a sossegada confusão onde Martim caíra. (...)"

Clarice Lispector in "A Maçã no Escuro"

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“To be nobody but yourself in a world which is doing its best day and night to make you like everybody else means to fight the hardest battle which any human being can fight and never stop fighting.” E.E. Cummings

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